Yusuf Karadaş: A agressão de Israel contra o Irã e o projeto de partilha imperialista

Yusuf Karadaş
Evrensel Gazetesi

Com a ofensiva de grande envergadura lançada por Israel, tendo como alvo instalações estratégicas e figuras proeminentes do Irã, o poder de choque do Estado sionista — agente de execução mais agressiva da política de redesenho do Oriente Médio promovida pelo imperialismo estadunidense — foi elevado à sua etapa mais crítica e perigosa. Nos bombardeios dirigidos, que se concentraram principalmente na capital, Teerã, mas que também se estenderam a diversas outras cidades, tendo como alvos centrais bases nucleares e militares, perderam a vida não apenas o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas do Irã, Mohammad Bagheri, e o Comandante da Guarda Revolucionária Islâmica, Hossein Salami, mas também um expressivo número de cientistas envolvidos nos projetos nucleares do país.

Embora a resposta iraniana, materializada através do lançamento de cerca de uma centena de drones (SÍHAs) contra Israel, tenha sido um desdobramento esperado e previsível, é evidente que, a partir deste momento, os passos subsequentes e os atores que entrarão em cena se tornarão fatores decisivos para a definição do alcance desta guerra e de seus impactos geopolíticos sobre toda a região.

Apesar das negativas emitidas pelo Secretário de Estado dos EUA, Rubio, que afirmou categoricamente que Washington não teria qualquer envolvimento na agressão israelense, é impossível ignorar o fato de que o estopim desta operação foi aceso já em março pelo ex-presidente Donald Trump. Tão logo assumira o cargo, Trump enviara, através dos Emirados Árabes Unidos, uma carta ao Líder Supremo do Irã, Ali Khamenei, estabelecendo um ultimato de dois meses para que Teerã aceitasse as condições impostas por Washington para um novo acordo nuclear, sob a ameaça explícita de uma resposta militar “terrível” caso houvesse recusa. O fato de que este ataque israelense ocorre precisamente num momento em que estavam em curso as negociações entre Estados Unidos e Irã sobre o programa nuclear iraniano (centrado no enriquecimento de urânio), demonstra de forma inequívoca que a ofensiva sionista não se deu à revelia dos EUA, mas, ao contrário, foi acionada como instrumento de pressão para arrancar de Teerã as concessões desejadas por Washington nas mesas de negociação. A decisão do Irã, anunciada logo após os ataques, de retirar-se das conversações que seriam retomadas em Omã no dia 15 de junho, não altera em nada esta realidade objetiva.

A declaração da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), organismo encarregado de legitimar politicamente a escalada de ataques e pressões ocidentais contra o Irã, acusando Teerã de violar suas obrigações no campo da não proliferação de armas nucleares, somada à movimentação da chamada tríade europeia (Reino Unido, França e Alemanha), que passou a preparar-se para levar tal relatório ao Conselho de Segurança da ONU, com o objetivo de restaurar as sanções contra o Irã, evidenciam de forma cristalina que a agressão israelense recebeu respaldo e estímulo não apenas do imperialismo estadunidense, mas também dos imperialistas europeus. Especialmente num contexto em que os crimes de guerra cometidos por Israel em Gaza, assumindo contornos genocidas, tornaram-se politicamente indefensáveis até mesmo perante a opinião pública ocidental, os ataques ao Irã cumprem igualmente a função de desviar a atenção internacional, encobrindo tanto os crimes de Israel quanto a cumplicidade objetiva das potências imperialistas nesse processo de massacre.

Sobre o programa nuclear iraniano, hoje utilizado como pretexto central para as agressões, é preciso estabelecer com rigor histórico: este programa foi iniciado na década de 1960, durante o regime monárquico do xá, com apoio direto dos Estados Unidos e dos imperialistas ocidentais, e continuado, após a Revolução Islâmica de 1979, pelo regime teocrático dos aiatolás. A metamorfose política operada pelas potências imperialistas, que antes consideravam tal programa como legítimo e desejável enquanto o Irã era um regime aliado, e que passaram a qualificá-lo como “ameaça” após a mudança de regime, constitui um exemplo escancarado de como o direito internacional é manipulado e instrumentalizado ao sabor dos interesses estratégicos do imperialismo.

Ademais, é necessário lembrar que o próprio Irã firmou, em 2016, um acordo de cooperação nuclear com os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA, China, Rússia, Reino Unido, França) mais a Alemanha, o chamado P5+1. No entanto, foi o próprio Trump quem, em maio de 2018, à frente do governo dos EUA, rompeu unilateralmente este acordo.

Como sublinhado já na introdução deste artigo, o ataque direto ao Irã representa uma nova etapa na ofensiva de redesenho regional, inaugurada com a campanha de massacre, invasão e ocupação lançada por Israel contra Gaza em 2023, sob a égide dos interesses estratégicos do imperialismo estadunidense, com Israel operando como sua vanguarda militar na região. A sequência lógica dessa estratégia foi o enfraquecimento da resistência libanesa, particularmente do Hezbollah, importante elo da frente de resistência anti-imperialista, bem como os esforços para derrubar o governo Baathista de Bashar al-Assad na Síria. Israel, ao destruir a infraestrutura militar síria e ocupar pontos estratégicos, abriu espaço para que o grupo HTS e seu líder Colani, ao assumir o controle em Damasco, identificasse o Irã como “o maior inimigo”, pavimentando, assim, o caminho para a nova escalada de agressões israelenses.

É evidente que a preocupação central do imperialismo estadunidense e do Estado sionista de Israel vai muito além do programa nuclear iraniano. O objetivo estratégico é subjugar o Irã, seja através de um acordo humilhante, seja por meio de uma guerra de imposição, e, a partir daí, avançar para a eliminação sistemática de todas as forças que integram o eixo da resistência regional — desde o Hezbollah libanês, passando pelas Forças de Mobilização Popular do Iraque (Hašd aš-Šaʿbī), até os Houthis no Iêmen. Esta política encontra seu outro polo nos chamados Acordos de Abraão, cujo propósito último é aprofundar a “normalização” das relações entre Israel e os regimes árabes colaboracionistas, assegurando, assim, a hegemonia regional de Israel e a salvaguarda dos interesses estratégicos dos Estados Unidos no Oriente Médio.

Apesar das duras perdas sofridas por seus aliados e da violência da atual ofensiva, o Irã mantém sua posição como uma potência regional significativa e resiliente. Contudo, é inegável que, por trás do alvo imediato representado por Teerã, há um projeto mais amplo, que visa também limitar o poder crescente da Rússia — que, após a mudança de regime na Síria, assinou com o Irã, em janeiro de 2025, um Acordo de Parceria Estratégica Abrangente — e da China, cuja Iniciativa do Cinturão e Rota (Nova Rota da Seda) vem transformando a região em um ponto crucial da disputa hegemônica global entre as potências imperialistas.

Assim, é imprescindível observar, com máxima atenção, qual será a postura adotada por Rússia e China, esta última demonstrando reiterada disposição em evitar um confronto direto e prematuro com os EUA, no que diz respeito ao desdobramento dos próximos capítulos desta crise regional.

Por fim, no tocante ao governo de Erdogan na Turquia, embora este tenha proferido declarações de condenação “veemente” aos ataques israelenses contra o Irã, sua participação ativa nas políticas de redesenho do Oriente Médio lideradas pelo imperialismo estadunidense o coloca, na prática, no mesmo eixo estratégico de Israel. A título de exemplo, o porta-voz do AKP, Ömer Çelik, ao criticar Israel, evitou dirigir uma única palavra de censura ao verdadeiro mentor da agressão: os Estados Unidos. O governo Erdogan, ao desempenhar papel central na tentativa de mudança de regime na Síria, ao atuar como força de equilíbrio contra o Irã no Iraque e ao manter, apesar de todas as críticas internas, as relações comerciais com Israel sob variadas formas, se configura como um dos elementos facilitadores da agressão sionista e da reconfiguração imperialista da região. Não obstante, é correto afirmar que Erdogan também demonstra preocupação com o crescimento da influência regional de Israel e o consequente estreitamento de seu próprio espaço de manobra, o que, a uma primeira vista, pode parecer contraditório, mas, em realidade, reflete o caráter dialético e ambíguo da política externa turca. De fato, enquanto não houver um confronto aberto entre Turquia e Israel, esta contradição estrutural continuará a desempenhar uma função instrumental dentro da estratégia de redesenho regional traçada por Washington.

Os acontecimentos que se desenrolaram desde os massacres e a ocupação de Gaza, iniciados em 2023, até os dias de hoje, reafirmam uma lição histórica essencial: para impedir uma guerra regional de proporções devastadoras, não basta condenar Israel. É necessário enfrentar de forma direta e contundente os verdadeiros sustentáculos desta agressão: o imperialismo estadunidense, os imperialistas europeus e os regimes colaboracionistas, como o governo Erdogan. Somente por meio da unidade das massas populares da região, rompendo com as divisões étnicas, religiosas e sectárias, e articulando uma luta comum contra o imperialismo e seus lacaios, será possível construir um futuro de paz e dignidade para os povos do Oriente Médio, sustentado pela solidariedade internacionalista dos trabalhadores e povos do mundo inteiro!